Cuando el gobierno informa mal: el covid-19 y el tratamiento temprano en Brasil
When the government disinforms: covid-19 and early treatment in Brazil
Quando o governo desinforma: a covid-19 e o tratamento precoce no Brasil
e-ISSN: 1605 -4806
VOL 25 N° 112 septiembre - diciembre 2021 Monográfico pp. 115-131
Recibido 11-11-2021 Aprobado 28-12-2021
https://doi.org/10.26807/rp.v25i112.1856
Daniela de Ulysséa Leal
Brasil
Universidade Federal de Viçosa
ulyssealeal@gmail.com
Ivonete da Silva Lopes
Brasil
Universidade Federal de Viçosa
ivonetelopes@ufv.br
Marco Paulo Andrade
Brasil
Universidade Federal de Viçosa
marco.paulo@ufv.br
Resumo
Em meio a pandemia do novo coronavirus, muitas ações do governo federal brasileiro têm contribuído para gerar desinformação e agravar a crise sanitária. O presente artigo busca compreender como os perfis no Twitter do Ministério da Saúde e do presidente da República Jair Bolsonaro foram utilizados para propagar notícias sem evidência científica, sobretudo em relação ao tratamento precoce da Covid-19. Adota-se como metodologia a análise de conteúdo da Public Timeline desses perfis, entre março/2020 e março/2021. O estudo do corpus de 106 tweets aponta que as referidas contas se ancoram para criar um viés de confirmação ao disseminar a desinformação. Houve ocorrência de 32% e 67% de desinformação nas publicações encontradas, respectivamente, nos perfis @jairbolsonaro e @minsaúde.
Palavras-chave: Desinformação; Tratamento precoce; Twitter; Covid-19.
Abstract
Amid the pandemic of the new coronavirus, many actions of the Brazilian federal government have contributed to generate misinformation and worsen the health crisis. This article seeks to understand how the Twitter profiles of the Ministry of Health and the President of the Republic Jair Bolsonaro have been used to spread news without scientific evidence, especially regarding the early treatment of Covid-19. We adopt as methodology the content analysis of the Public Timeline of these profiles, between March/2020 and March/2021. The study of the corpus of 106 tweets points out that these accounts anchor themselves to create a confirmation bias when disseminating misinformation. There was an occurrence of 32% and 67% of misinformation in the publications found, respectively, in the profiles @jairbolsonaro and @minsaúde.
Keywords:Disinformation; Early Treatment; Twitter; Covid-19.
Resumen
En medio de la pandemia del nuevo coronavirus, muchas acciones del gobierno federal brasileño han contribuido a generar desinformación y a empeorar la crisis sanitaria. Este artículo busca entender cómo los perfiles de Twitter del Ministerio de Salud y del Presidente de la República Jair Bolsonaro han sido utilizados para difundir noticias sin evidencia científica, especialmente en lo que respecta al tratamiento temprano del Covid-19. Se adopta como metodología el análisis de contenido del Timeline Público de estos perfiles, entre marzo/2020 y marzo/2021. El estudio del corpus de 106 tuits señala que las cuentas referidas se anclan para crear un sesgo de confirmación al difundir información errónea. Hubo una ocurrencia de 32% y 67% de desinformación en las publicaciones encontradas, respectivamente, en los perfiles @jairbolsonaro y @minsaúde.
Palabras-clave: Desinformación; Tratamiento temprano; Twitter; Covid-19.
1. Introdução
O Brasil tem se tornado um caso emblemático para pesquisas no campo da comunicação da Covid-19. De um lado, a hiperabundância de informação sobre a crise sanitária está gerando uma infodemia. Os riscos trazidos pela confiabilidade dessas informações representam um problema de saúde pública, considerando que neste momento de crise a população precisa de orientação precisa e confiável para se proteger e reduzir o impacto do novo coronavírus (OMS 2020). De outro lado, a situação se agrava no Brasil, com ações do governo federal que contribuem para gerar desinformação (Ventura & Bueno, 2021; Recuer &, Soares, 2020; Lopes & Leal, 2020) enquanto muitas nações têm concentrado esforços para barrar ou minimizar a propagação de fake news (Meneses, 2019).
Nessa conjuntura, os órgãos nacionais de saúde ocupam um papel relevante como fonte de informação. Podem ser vistos, segundo a perspectiva de Giddens (1991), como sistema especializado ou sistema perito, sistemas de excelência técnica ou de competência profissional que organizam os ambientes material e social, definindo grande parte das ações do cotidiano. Para o autor, a confiança da população leiga nestes sistemas independe de alguma iniciação nos processos ou de qualquer domínio de conhecimento, ela se dá por elementos pragmáticos de fé, “baseado na experiência que tais sistemas geralmente funcionam como se espera que eles façam” (1991, p.38). Desta forma, espera-se destes sistemas, principalmente em meio a uma pandemia, respostas para governança de enfrentamento de risco (Fiocruz, 2020).
Kunsch (2016) aponta que instituições de saúde, como Ministério da Saúde, tem a responsabilidade de realizar uma comunicação pública que busque amenizar os problemas cruciais da população, especialmente em um contexto de pandemia. Este tipo de comunicação, em meio a uma crise sanitária, desempenha um papel fundamental em termos de enquadramento do risco, que são estruturas inconscientes que organizam e traduzem as experiências de vida e aplicam esquemas interpretativos sobre os riscos (Silva, Fra Paleo & Ferreira Neto, 2019), facilitando o consenso social sobre todos os aspectos da pandemia. Neste sentido, estudos já apontaram que indivíduos expostos a informações precisas e confiáveis tendem a adotar comportamentos mais preventivos durante o surto de uma epidemia (Wang et al, 2020) e a confiança pública na informação molda tanto a aderência às práticas recomendadas como a rapidez no seu cumprimento (Ipsen, Myers & Sage, 2021)
O viés negacionista tem conduzido estratégias de órgãos oficiais, sistemas peritos de saúde coletiva, como o Ministério da Saúde, impulsionando desinformações que motivam comportamentos sociais (Ventura & Bueno, 2021; Recuero & Soares, 2020; Goulart & Munhoz, 2020; Lopes & Leal, 2020). Devido a um falso antagonismo entre a economia e a saúde, no qual se afirma que as medidas de contenção do contágio (e não uma pandemia) prejudicariam o crescimento econômico, o Ministério da Saúde gerou um discurso ruidoso, confuso, dúbio e repleto de incertezas (Sodré, 2020). Neste sentido, aceitação de intervenções sem validação científica, como o caso do tratamento precoce, é usada pelo presidente da república brasileiro, Jair Bolsonaro (2019-atual). Essa é uma estratégia que articula a ideia de que se existe um suposto tratamento eficaz, não há motivos para continuar com isolamento social (Caponi, 2020)
Deste modo, o surto do novo coronavírus no Brasil tem sido enquadrado como uma questão político-partidário e não um problema de saúde pública (Recuero et al., 2020), de modo que a politização e o negacionismo em torno da doença têm causado danos à saúde coletiva no Brasil e fragilizado nossas bases democráticas, visto que o Brasil é considerado um dos países com maior produção, circulação e consumo de fake News do mundo (Fernandes & Montuori, 2020). De acordo com Recuero et al. (2020), a desinformação oriunda de autoridades, em especial as que ocupam cargo político ou possuem expertise na área da saúde, tende a se disseminar mais rápido e entre mais pessoas do que a propagada por pessoas comuns ou por contas automatizadas.
Deste modo, alguns episódios corroboram para ilustrar esta desinformação e o engajamento de fake news. Em 17/03/2021 o tratamento precoce (da Covid-19) foi um dos assuntos mais comentado no Twitter Brasil, com 53,7 mil publicações, motivado, principalmente, por disputas entre aqueles que defendem tal práticas e os contrários, pela ausência de evidência científica. Considera-se este impacto ao levar em conta que o Twitter tornou-se o meio de comunicação mais frequentemente utilizado para a divulgação de informação sanitária desde o surto de H1N1, durante o surto do vírus H7N9, ou gripe aviária, em 2013 e a epidemia do vírus Zika em 2015 e 2016 (Tahamtan et al, 2021).
O ápice da desinformação foi a exclusão do post do MS pelo Twitter em 17/01/2021, pois a publicação, de 12/01/2021, estimulava o tratamento precoce e por isso violou as regras da plataforma por conter informações enganosas e potencialmente prejudiciais ao enfrentamento da Covid-19. Apesar de possibilitar a disseminação de desinformações, as redes sociais podem ser ferramentas importantes de comunicação em saúde pública, especialmente por seu potencial para informar, motivar e envolver utilizadores (Pinto, Antunes e Almeida, 2020).
Baseado nesta conjuntura, o presente artigo busca analisar as estratégias utilizadas pelos perfis no Twitter do Ministério da Saúde e do presidente da República Jair Bolsonaro para promover o tratamento precoce. da Covid-19. Este trabalho está dividido em quatro seções além desta introdução, seguida pela discussão das teorias que podem elucidar a natureza da desinformação. Depois, apresenta-se o percurso metodológico adotado, resultados e discussões, finalizando com as considerações finais.
2. A construção da desinformação
A repercussão em redes sociais sobre o uso de medicamentos sem comprovação científica no tratamento precoce reflete aspectos do regime da pós-verdade. Para Harsin (2018), a ideia de pós-verdade não se refere a um período “depois” da verdade, mas sim a uma quebra da confiança social em instituições de elite interligadas, produtoras e guardiãs da verdade, como igreja, a ciência, os governos, imprensa, etc. Para o autor, o que passa a ser aceito como verdade popular é uma forma de conhecimento frágil, ou seja, uma opinião baseada na confiança naqueles que supostamente sabem.
Esta lógica populista busca retratar o povo e a elite como antagonistas, sugerindo, entre outras, que especialistas são menos confiáveis que as pessoas comuns, sendo a perícia suspeita e a verdade relativa (Mede & Schafer, 2020). No discurso da pós-verdade, as atitudes críticas ordinárias, oriundas da incerteza e das desconfianças, alcançam novas dimensões quando fatos objetivos passam a ter menos influência em moldar a opinião pública do que apelos à emoção e a crenças pessoais (Sacramento & Paiva, 2020).
À abordagem da pós-verdade é introduzida por Claire Wardle e Hossein Derakhshan (2017) uma nova estrutura conceitual para se examinar os distúrbios das informação, que podem ser classificados em três tipos diferentes: Informação incorreta (Mis-Information) – quando informações falsas são compartilhadas, mas sem intenção de dano; Desinformação (Dis-information) – quando informações falsas são conscientemente compartilhadas para causar danos; Mal-informação (Mal-information) – quando informações genuínas são compartilhadas para causar danos, muitas vezes através da publicação de informações destinadas a permanecerem privadas.
A desinformação é abordagem conceitual que nos interessa aprofundar por ser, entre as categorias de Wardle e Derakhshan (2017), a que melhor possibilita analisar o estímulo ao tratamento precoce no Brasil. Nesta perspectiva corroboram Recuero e Soares (2020) ao destacar que a desinformação pode abranger grande variedade de conteúdo, de estratégias de disseminação e graus de interferência intencional sobre a informação. Pode ser categorizada como: informação fabricada (Informação completamente falsa, fabricada ou sem nenhuma evidência); informação com enquadramento enganoso (Informações verdadeiras utilizadas para criar um sentido falso devido a forma como são apresentadas) e informações manipuladas (Informações parcialmente verdadeiras manipuladas para construir um falso sentido).
A desinformação se tornou parte significativa da dieta informacional obtida digitalmente, visto que a crescente digitalização de tudo o que a vida comporta inclui a atividade de falsificar e alterar fatos, com o objetivo, inclusive, de manipular as pessoas politicamente (Gomes & Dourado, 2019). Como as tecnologias interativas propiciam a ampliação das formas de conexão entre indivíduos e, entre indivíduos e grupos, rompendo a horizontalidade da comunicação dos meios tradicionais, descentraliza os discursos e o conhecimento (Fernandes & Montuori, 2020). Para estas autoras, este cenário coletivo de produção e propagação de conteúdo desemboca em uma crise informacional, relacionada à qualidade daquilo que é disseminado.
A pandemia aumentou o consumo de veículos de mídia tradicionais, como televisão (Reuters Instituto, 2020), inclusive no Brasil onde 61% da população considera a mídia televisiva a mais confiável na divulgação de informações sobre o coronavírus, conforme pesquisa do Instituto DataFolha (Folha de São Paulo, 2020). Todavia, segundo Wardle e Derakhshan (2017), a televisão tem tido papel importante na difusão e amplificação de informações de má qualidade que tem origem on-line.
De acordo com pesquisa do Instituto Reuters, 88% das alegações falsas pesquisadas sobre o coronavírus apareceram em plataformas de mídia social, em comparação com 9% na televisão ou 8% em veículos de notícias. Durante emergências de saúde de dimensões pandêmicas, a difusão de desinformação se prolifera devido ao sensacionalismo, que acaba contribuindo para a ampliação social do risco através da exploração das emoções humanas, e pelo vício da repercussão ágil de informação incompleta ou inexata (Vasconcellos-Silva e Castiel, 2020). Sendo assim, as redes sociais on-line permitem, também, novas lógicas de agrupamento, ao reunir indivíduos que partilham crenças e opiniões, e que se sentem confortáveis para suspender as barreiras da censura, apresentando uma mudança significativa na organização social e em seu relacionamento com a verdade (Sacramento & Paiva, 2020).
Para Wardle e Derakhshan (2017), as redes sociais são impulsionadas pelo compartilhamento de conteúdo emocional. Nesta perspectiva, Sacramento e Paiva (2020) sublinham que a internet tem cada vez mais desempenhado papel fundamental na construção da ignorância ao viabilizar a circulação de informações e práticas discursivas que promovem uma maior aceitação de discursos baseados nas experiências do que naqueles que se baseiam em evidências e métodos científicos.
Diante disto, pode-se perceber os caminhos pelos quais a desinformação é construída, criando uma matriz referencial equivocada, induzindo a percepções distorcidas do mundo. Neste sentido, a crença é, então, um elemento fundamental na disseminação da desinformação, pois a partir dela é que se delineiam a formação da opinião e as representações da realidade, e não a partir da verdade (Alzamora & Andrade, 2019). Para as autoras, as imagens estereotipadas da realidade suscitam crenças que moldam sentimentos, pensamentos e ações, desta forma, a crença faz com que a desinformação circule, mesmo havendo indícios de falsidade em seu conteúdo, sustentando-se nos arraigados hábitos de ação. Dentro deste contexto de pandemia, é pertinente lembrar que Martine e Alves (2019, p.19) afirmam que “a opinião pública é mais facilmente influenciada pela propaganda negacionista, pois ela desobriga as pessoas de mudar seu comportamento ou enfrentar questões complexas relacionadas ao paradigma de [enfrentamento à Covid-19 e proteção da vida]”.
Deste modo, Sacramento e Paiva (2020) esclarecem que são fluidas as fronteiras entre a crença e convicção, entre o “acreditar que” e o “acreditar em”. Para os autores, na convicção, o sujeito está comprometido com um sistema simbólico de explicação do mundo que lhe dá segurança ontológica, não abrindo margem para outras visões de mundo, o que ratifica a escolha do familiar em detrimento ao estranho. Neste sentido, em agrupamentos mais afins a polarizações político-ideológicas existe maior dificuldade na circulação da informação qualificada e checada, devido à tentativa de proteger as suas crenças através da negação de fatos ou de evidências contrárias (Recuero et al., 2020).
A capacidade catártica destes discursos desinformacionais reforçam crenças pessoais, proliferando a difusão da desinformação motivada pelo sensacionalismo, que contribui para a ampliação social de riscos através da exploração das emoções humanas (Vasconcellos-Silva & Castiel, 2020). De acordo com estes autores, este apelo emocional promove a repercussão ágil de informação incompleta ou inexata. A velocidade líquida das postagens não respeita o tempo necessário para o cérebro verificar a veracidade do fato narrado (Fernandes & Montuori, 2020).
Entretanto as diferentes sociedades têm capacidades distintas para resistir às desinformações. Segundo o estudo de Edda Humprecht (2019), a desinformação sobre o novo coronavírus é mais difundida em países marcados por níveis elevados de polarização da sociedade, assim como a baixa confiança nas instituições públicas e a instrumentalização da ciência, fatores que podem levar os indivíduos a propagar alegações não fundamentadas. Para a autora, a resistência à desinformação, presente por exemplo na sociedade suíça, se deve à disponibilidade de fontes de notícias confiáveis e grande confiança na ciência e na gestão da crise sanitária.
Diante do exposto, percebe-se que a construção da ignorância, através da imbricação de interesses políticos e interações digitais e da afirmação de crenças pessoais são elementos fundamentais para a propagação da desinformação, comprometendo áreas fundamentais para o bem estar social, como a saúde coletiva e a democracia.
3. Metodologia
Esta pesquisa tem caráter qualitativo e lança mão de uma base metodológica que combinou a análise bibliográfica, buscando aprofundar o entendimento sobre desinformação e a governança do risco da Covid-19, e da Análise de Conteúdo de Bardin (1995) da Public Timeline do perfil do Ministério da Saúde e do Presidente Jair Bolsonaro no Twitter, entre os dias 01 de março de 2020 e 01 de março de 2021.
A conta do Ministério da Saúde nesta plataforma foi iniciada em 2009 e conta atualmente com cerca de 1,3 milhões1 de seguidores e a de Jair Bolsonaro, iniciada em março de 2010, tem 6.7 milhões. Para realizar o text mining no Twitter foi solicitado uma conta de desenvolvedor para ter acesso à Interface de Programação de Aplicativo (API) desta rede social. Utilizamos o software Python junto a API e a biblioteca tweepy para rodar o script e recuperar tweets nos perfis @minsaude e @jairbolsonaro postados no referido período. As palavras-chave utilizadas na pesquisa foram: tratamento_precoce, cloroquina, ivermectina, Covid. Obtivemos uma amostra total de 126 tweets, sendo 61 referentes a conta do Ministério da Saúde (@minsaude) e 65 da conta do Presidente Jair Bolsonaro (@jairbolsonaro), conforme Quadro 1.
Quadro 1- Informações principais dos perfis estudados no Twitter
Twitter User |
@minsaude |
@jairbolsonaro |
Perfil |
Perfil oficial da Ministério da Saúde. |
Capitão do Exército Brasileiro, eleito 38º Presidente da república Federativa do Brasil |
Seguidores |
1,3 mi |
6,7 mi |
Seguindo |
485 |
550 |
Total de Tweets |
61 |
65 |
Excluídos por estarem for a do escopo |
15 |
5 |
Tweets sobre tratamento precoce no período estudado |
46 |
60 |
Fonte: Elaboração própria com base nos dados da pesquisa
Após a pró-análise (Bardin 1995) das 126 publicações, 20 Tweets foram excluídos por estarem fora do escopo desta pesquisa: cinco deles do @jairbolsonaro e 15 do @minsaude. Procedendo com a análise proposta por Bardin (1995, p.17), a categorização constitui uma “operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto, por diferenciação e, seguidamente, por reagrupamento”, de acordo com os critérios previamente definidos, os tweets foram agrupados em quatro categorias:
4. Resultados e discussão
O corpus de análise é formado por 106 Tweets, 60 deles publicados por Jair Bolsonaro e 46 pelo Ministério da Saúde, conforme quadro 2 e 3. De acordo com as categorias estabelecidas, no perfil @jairbolsonaro não foi encontrada nenhuma publicação que se enquadrasse no grupo incerteza. Os posts do presidente foram bastante assertivos sobretudo quando se referiam criticamente às medidas de isolamento social e à defesa da cloroquina como medicamento para o tratamento precoce. Foram 18 os Tweets com desinformação, correspondendo a 32% das publicações desse perfil, como ilustram os trechos “[...]o Lockdown matou 2 pessoas pra cada 3 de Covid no Reino Unido. No Brasil, mesmo ainda sem dados oficiais, os números não seriam muito diferentes” (09/08/2020) e “Temos informações precisas que a Cloroquina tem sido usada pelo Brasil com uma grande taxa de sucesso” (27/03/2020).
As ações de divulgação representaram 59% (33 postagens) e se concentraram entre junho e julho de 2020, um dos períodos mais críticos da primeira onda da pandemia. O comportamento do perfil @jairbolsonaro vai ao encontro das ações de comunicação do MS, que neste mesmo período focou em ações propagandísticas numa tentativa de mostrar a entrega de equipamentos e leitos aos estados (Lopes, Leal, 2020). Contudo tanto as campanhas do MS quanto as publicações do presidente destoavam da realidade exibida pelos noticiários que mostravam a falta de leitos e equipamentos nos hospitais, o colapso no sistema de saúde.
A categoria “Outras” (9%) demonstra uma significativa incidência de Tweets relacionados a queixas pessoais e ataques a desafetos, como a mídia e a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) por reconhecer a autonomia dos municípios e estados na gestão de medidas de enfrentamento à Covid-19.
Quadro 2: Categorias e ocorrência Perfil @jairbolsonaro
Exemplo |
Ocorrência |
|
Divulgação |
@minsaúde libera mais de R$600 milhões para ações de combate ao vírus. Apoio para incentivar pequenos produtores orgânicos no Brasil durante a Covid-19.@Mapa Brasil @TereszaCrisMS Distribuição inicial de 3,4 mi de unidades de cloroquina e hidroxicloroquina para uso em pacientes seguindo as orientações médicas. |
59% |
Desinformação |
Conclui-se que o Lockdown matou 2 pessoas pra cada 3 de Covid no Reino Unido. No Brasil, mesmo ainda sem dados oficiais, os números não seriam muito diferentes. – Lamentamos cada morte, seja qual for a sua causa, como a dos 3 bravos policiais militares executados em São Paulo. Temos informações precisas que a Cloroquina tem sido usada pelo Brasil com uma grande taxa de sucesso. – O remédio existe, apenas se aguardavam as formalidades para seu uso legal. – Nossos parabéns à @anvisa_oficial pela presteza na liberação do registro Aos primeiros sintomas procure um médico e inicie o tratamento precoce. - Não espere sentir falta de ar para tomar essa decisão de PROCURAR UM MÉDICO e iniciar o TRATAMENTO PRECOCE. O Brasil é um dos países que tem o maior número de recuperados da Covid-19. |
32% |
Outros |
O STF determinou que as ações diretas em relação ao Covid-19 são de responsabilidade de estados e municípios. Mesmo assim, o @govbr não tem medido esforços no auxílio dos brasileiros desde o início. Lamentavelmente, estes fatos não são mostrados na maior parte da mídia. @secomvc A desinformação mata mais até que o próprio vírus. O tempo e a ciência nos mostrarão que o uso político da Covid por essa TV trouxe-nos mortes que poderiam ter sido evitadas. |
9% |
Fonte: Elaboração própria com base nos dados da pesquisa
O corpus do Ministério da Saúde é formado por 46 publicações que foram distribuídas entre três categorias: divulgação, incerteza e desinformação. Nesse último grupo foram encontrados 31 posts ou 67% dos Tweets do MS, o que, em meio a uma pandemia, põe em desacordo seu papel de sistema perito em saúde ao desinformar em vez de focar os esforços para comunicar os riscos da pandemia e medidas de prevenção. A maioria dos Tweets seguiram este padrão narrativo: “[...] recomendação da cloroquina na fase precoce do coronavírus, o Ministério da Saúde considerou estudos e a experiência brasileira” (02/09/2020).
As publicações do grupo incertezas corresponderam a 22%, essas se concentram entre março e 25 de maio de 2020, período no qual o MS lidava com o desconhecimento sobre o novo coranavírus e eram grandes as dúvidas sobre o protocolo de atendimento médico. Por último, a divulgação (11%) abarca o restante das postagens, não havendo nenhuma que possa ser classificada como Outras, que abordam a pandemia por uma perspectiva diferente.
Quadro 3: Categorias e ocorrência perfil @minsaude
Categoria |
Exemplo |
Ocorrência |
Incerteza |
O @minsaude divulga as diretrizes para o tratamento medicamentoso de pacientes. As recomendações publicadas nesta quarta (20) são para o tratamento precoce, com #cloroquina e #hidroxicloroquina, de pacientes com #COVID19 no SUS. @minsaude está deixando a #cloroquina à mão do médico como mais um reforço no atendimento a paciente grave hospitalizado. “Vamos deixar o remédio ao alcance do médico”. O medicamento só deve ser usado com recomendação médica #coronavírus |
22% |
Divulgação |
O ministro @lhmandetta deu uma orientação a quem comprou a #cloroquina sem a indicação médica. “Se você cometeu essa iniciativa mediada pela falta de informação, o mais correto a fazer é pegar a caixa e entregar ao farmacêutico, ao hospital ou posto de saúde”. #coronavirus O @minsaude vai distribuir aos estados 3,4 milhões de unidades dos medicamentos #cloroquina e #hidroxicloroquina para uso em pacientes internados com formas graves de #coronavírus. Saiba mais sobre os benefícios e entenda o risco da automedicação: https://saude.gov.br/noticias/agencia-saude/46601-cloroquina-podera-ser-usada-em-casos-graves-do-coronavirus |
11% |
Desinformação |
Para a recomendação da cloroquina na fase precoce do coronavírus, o Ministério da Saúde considerou estudos e a experiência brasileira. O Conselho Federal de Medicina também propôs que médicos considerassem a cloroquina com o consentimento do paciente. O secretário de Vigilância em Saúde do @minsaude, Arnaldo Medeiros, destacou que o diagnóstico e o tratamento precoce contra a #Covid19 são importantes para evitar o agravamento de casos e até mortes. Leia mais: https://bit.ly/3am3FlK |
67% |
Fonte: Elaboração própria com base nos dados da pesquisa
Com base nos Quadros 02 e 03, foi possível estabelecer uma comparação entre as postagens dos dois perfis, conforme figura 01:
Figura 01 Gráfico de Tweets por categoria
Fonte: Elaboração própria com base nos dados da pesquisa
Ao analisar as estratégias utilizadas pelos perfis no Twitter do Ministério da Saúde e do presidente da República Jair Bolsonaro para promover o tratamento precoce da Covid-19, pode-se observar que a conta institucional do MS produziu mais desinformação sobre este tratamento em relação a do presidente. Todavia, a conta presidencial produziu um número maior de tweets sobre o assunto, só que com uma perspectiva voltada à divulgação de ações do governo federal.
A categoria de Incertezas é preponderante no início da pandemia no perfil do Ministério da Saúde, pois havia naquele período muitas inquietações sobre o tratamento com cloroquina e hidroxicloroquina para a Covid-19, haja visto que o ministério, na rede social, pedia precaução com o uso do remédio, inclusive por causar sérios efeitos colaterais, ao mesmo tempo que recomenda as diretrizes para o tratamento precoce com estes fármacos. Importante destacar que o termo “efeitos colaterias” tem apenas uma ocorrência em toda a pesquisa, e aparece na conta do MS, nesta fase de incertezas.
Entretanto, enquanto o MS buscava ser mais cauteloso, Jair Bolsonaro, em sua conta pessoal promove o remédio, afirmando que o governo zerou impostos para a importação de cloroquina, deu licença para laboratórios nacionais pesquisarem cloroquina e ampliou a produção destes remédios pelos laboratórios das Forças Armadas. Essas ações do presidente corroboram para a estruturação de um regime desinformacional, principalmente considerando que seu perfil pessoal do Twitter é o veículo central de divulgação de sua atuação, além da interlocução com a população brasileira. O papel de Presidente da República é representado imageticamente como figura de poder, um índice balizador de crenças que serve como um viés de confirmação das mesmas. Aqui verifica-se o que Manfredi-Sánchez, Amado-Suárez & Waisbord (2021) denominam de “político pop”, um presidente que se apoia em redes sociais para comunicar decisões, interpretar o meio e validar políticas. Para os autores, uma crise sanitária favorece uma política da “impaciência”, desarticulada da mídia tradicional e caracterizada por um comportamento impulsivo.
Apesar desta comunicação promovendo a adoção da cloroquina e da hidroxicloroquina, neste período, o estudo de Pacheco e Riera (2020) indicava que a eficácia e segurança destas medicações em pacientes com Covid-19 ainda era incerta (muito baixa certeza de evidência) e seu uso rotineiro para essa situação não deveria ser recomendado até que os resultados dos estudos em andamento fornecessem avaliação adequada de seus efeitos.
Durante o mês de abril o assunto do tratamento precoce e uso da cloroquina desaparece no Twitter do MS e na conta do presidente, o que pode estar relacionado com tensões internas da gestão. Em 17 de abril há a troca de ministro, quando assume, no lugar de Luiz Henrique Mandetta, o oncologista Nelson Teich, que fica menos de um mês no cargo. A pasta estava em embate com Bolsonaro, sobre o uso da cloroquina. Deste modo, o general Eduardo Pazzuelo, especialista em logística, assume o Ministério da Saúde interinamente e implemente, em 21 de maio, um protocolo nacional para incentivar o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19 em hospitais públicos. Evidenciou-se a pulsão do governo em agir segundo seus preceitos pessoais/achismo carregado de um posicionamento político ideológico em detrimento às recomendações científicas e o bem coletivo.
O Ministério volta a tweetar sobre o uso destas substâncias, em 28 de maio, esclarecendo que o paciente tem liberdade de escolha, o que relativiza a opção do médico e fragiliza os protocolos sanitários. O Ministério destaca que o tratamento está disponível à toda população brasileira: “É o Governo do Brasil dando igual oportunidade para todos!”. Deste modo o MS, com o aval de ser um sistema perito, lança mão de sua rede social para espalhar desinformação para a sociedade brasileira, sugerindo que o tratamento do vírus existe e o governo o disponibiliza (o que pode gerar entendimento de que os protocolos de prevenção e enfrentamento são supérfluos).
Notadamente, com o avançar da pandemia, a indicação desses medicamentos, assim como o conceito de tratamento precoce, sofreu alterações ao longo do período estudado, por parte de ambos perfis. O uso da cloroquina foi recomendado, inicialmente, para pacientes com estado grave, hospitalizados. Este primeiro caso já dificulta o entendimento sobre o termo “tratamento precoce”, já que a gravidade da doença e a hospitalização se dão com o avanço da mesma. Diante da falta de um protocolo baseado em evidências científicas, a partir de maio, a cloroquina passa a ser indicada para casos leves, com recomendação médica e autorização do próprio paciente/família. Contudo, no dia seguinte (29/05/2020), o MS publica que “os medicamentos não são indicados para prevenir a doença e nem tratar casos leves”.
Desta maneira, o ministério desassocia estes fármacos do que pode ser entendido como tratamento precoce, ampliando mecanismos semânticos sobre o termo, que colaboram com o desentendimento e a desinformação, já que em 09 de julho/2020 é publicado um tweet esclarecendo que “os pacientes devem buscar esse atendimento, mesmo que sejam sintomas leves” e “o tratamento precoce tem uma resposta mais assertiva”. Sendo assim, o Ministério da Saúde, ao longo do mês de julho, defendeu a necessidade de se intensificar o tratamento precoce, o atendimento, o diagnóstico e a prescrição médica.
Demonstrando ter um plano de ação fragmentado e sem planejamento estratégico, o Ministério da Saúde, em setembro, esclarece que o protocolo de atendimento aos casos de coronavírus mudou, pois deve-se procurar uma unidade de saúde ao menor sintoma gripal, afirmando que o tratamento precoce salva vidas. Vale destacar que a mudança constante de protocolos não se deu por acompanhar os avanços da ciência, como as demais informações sobre o novo vírus, já que o tratamento precoce foi descartado como solução pelas comunidades científicas ainda na fase inicial da pandemia.
Apesar da falta de evidências científicas, o órgão passa a recomendar a cloroquina na fase inicial da Covid-19, e afirma estar considerando estudos (sem apresentá-los) e a experiência brasileira (sem também comprovação de dados). Um dos fatores que sustenta a pós-verdade e a desinformação é o discurso buscando este alinhamento entre experiência e ciência, como se ambas tivessem o mesmo peso e rigor metodológico.
Neste período, o MS cita que o Conselho Federal de Medicina propôs que médicos considerassem a cloroquina com o consentimento do paciente, e Bolsonaro, alinhando seu discurso com o do ministério, publica, que “Henrique Prata, diretor do Hospital do Amor de Barretos, recomenda a Cloroquina para o tratamento da Covid-19”. As associações médicas demoraram a se manifestar contrariamente a este protocolo, emitindo, só em 23/03/2021 um boletim do Comitê Extraordinário de Monitoramento Covid-19, organizado pela Associação Médica Brasileira (AMB), defendendo que medicamentos sem eficácia comprovada contra o novo coronavírus devem ter sua utilização banida (AMB, 2021). Porém, no sentido de reafirmar o posicionamento favorável ao tratamento precoce, o general Pazzuelo é efetivado como Ministro da Saúde no dia 16 de setembro, quando os laboratórios do Exército também passaram a produzir a hidroxicloroquina, chegando a um estoque de mais 1,85 milhão de unidades (Correio Braziliense, 2020).
Para agravar a crise informacional, o Ministério da Saúde, em 02 e 04 de janeiro de 2021, compartilhou em suas redes sociais um estudo publicado no The American Journal of Medicine, recomendando o uso precoce da hidroxicloroquina na prevenção da Covid-19 (Mccullough et al 2021). Contudo, tratava-se de um artigo de opinião visto que tem como referência uma série de artigos científicos sem evidências conclusivas e não levou em consideração estudos com outras metodologias, que têm maior relevância científica e que já comprovaram a ineficiência da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19. A referida postagem viralizou no Twitter através da conta de um médico, alcançando mais de 7,3 mil curtidas e 2,8 mil compartilhamentos (Comprova, 2021), demonstrando o potencial interativo existente na conjuntura em que o indivíduo, ideologicamente motivado, tem acesso a uma mensagem afim a seus interesses.
Além da cloroquina, Bolsonaro insere outros elementos ao escopo, pouco claro, do tratamento precoce: a Nitazoxanida, em 11/2020, (que segundo o presidente, “é um remédio de reposição, cientificamente demonstrado no tratamento precoce da Covid que reduz a carga viral”) e a Ivermectina, em 01/2021. De acordo com o presidente: “Nota-se a baixíssima taxa de óbitos por Covid em países africanos” atribuindo este resultado à distribuição em massa da Ivermectina.
O uso da Ivermectina, de preço acessível e disponível no mercado, se propagou como eficiente para o tratamento precoce contra Covid-19 com base em estudos in vitro (Caly et al 2020), porém existe grande dificuldade em reproduzir os resultados em estudos in vivo, sendo necessário uma overdose 17 vezes maior do que a dose máxima permitida para humanos, o que pode gerar, entre outras, depressão do sistema nervoso central. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já havia se posicionado em julho de 2020 (quase seis meses antes da postagem desinformativa de Bolsonaro) contra uso rotineiro desta para prevenção e tratamento da doença, reforçando que o medicamento antiparasitário tem apenas indicação para uso conforme o que consta na bula, como no tratamento de escabiose e piolho (Anvisa, 2020). A OMS e a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) também não recomendam o uso de Ivermectina para quaisquer outros propósitos diferentes daqueles para os quais seu uso está devidamente (OPAS, 2020).
Após a censura pelo Twitter em 16/01/2021 da postagem do MS de 12/01/2021, que incentivava o tratamento precoce, afirmando que houve publicação de informações enganosas e potencialmente prejudiciais em relação à Covid-19, o ministério não fez mais nenhuma postagem sobre o termo ou sobre os remédios incluídos neste protocolo. Entretanto a conta de Jair Bolsonaro continuou, até o fim do período pesquisado, sendo fonte de diversas desinformações sobre a pandemia.
5. Considerações finais
Diante do exposto foi possível perceber que o papel do Ministério da Saúde de comunicador de riscos em meio à pandemia do novo coronavírus foi desempenhado pela perspectiva negacionista em detrimento a evidencias científicas e fatos como. O Ministério da Saúde nega, assim, seu papel institucional de fonte de informação oficial e confiável, apesar de investido de poder para isso. Desta maneira, percebe-se uma mudança de regime de verdade quando a confiança em capacidades abstratas dos sistemas peritos, como o Ministério da Saúde em relação à governança de riscos de uma pandemia, passa a se pautar em dogmas e experiência pessoal. Esta autoridade de sistema perito permite, então, que a desinformação tenha lastro para se espalhar, levando médicos públicos e privados a prescreverem o tratamento precoce.
A maior parte das publicações na conta de Jair Bolsonaro tem aspectos de divulgação, demonstrando a determinação do presidente de levar à frente o estabelecimento do tratamento precoce como o melhor protocolo para a Covid-19, independente das evidências científicas que foram surgindo ao longo do período estudado. Esta posição do presidente tem influência clara na comunicação das muitas pastas de seu governo.
A falta de planejamento estratégico para o enfrentamento da pandemia é perceptível nos discursos do MS e do presidente Bolsonaro. A exemplo da indicação da cloroquina, que inicialmente se dá para os casos graves e passa a ser recomendada para casos leves e sintomas gripais. Da mesma forma, o termo “Tratamento Precoce” aparece de forma ambígua - ora para mencionar a necessidade de ir rapidamente ao serviço médico caso tenha sintomas e/ou especificamente para falar/indicar a cloroquina ou Ivermectina. O MS, após críticas, ainda busca desassociar o tratamento precoce de fármacos e o alinhar com a testagem e o diagnóstico. Desta maneira, estas vozes colaboram com a falta de unidade e de consenso social sobre o enfrentamento à Covid-19, o que leva ao agravamento da crise sanitária no Brasil.
Este estudo demonstrou que as contas do Twitter do MS e do presidente Jair Bolsonaro se ancoram (sustentam-se uma na outra) para criar um viés de confirmação ao disseminar a desinformação, isso ocorre também quando ambas reafirmam as publicações de uma na outra e quando ambas pinçam artigos acadêmicos e artigos noticiosos para confirmar as suas publicações e posicionamentos. Deste modo, aponta-se que só a literacia não seria suficiente para tentar minimizar os danos causados por essa estratégia, sendo necessário ações que abarquem a educação cientifica e critica.
Por fim, muitos estudos ainda serão necessário para se dimensionar os efeitos causados pela promoção do discurso do tratamento precoce como enfrentamento da pandemia no Brasil, tanto efeitos colaterais físicos nas pessoas que fizeram uso indevido destes medicamentos, como econômicos, pois o governo federal dedicou o primeiro ano da pandemia a esforços de comunicação sobre um tratamento inexistente.
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1 Em 22/03/2021